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COMO ATENDER TRANSTORNOS ALIMENTARES NA ADOLESCÊNCIA? UMA VISÃO SISTÊMICA DA NUTRIÇÃO

Por Simone Brasil Lintariami

Nutricionista. Mestre em Ciências da Saúde.

Consteladora Familiar

Psicodramatista

Autora do Livro Nutrição Sistêmica.


Ser adolescente é ter as emoções à flor da pele. É ter vontade de fugir, gritar, gargalhar, sorrir, pular, chorar e se sentir nas alturas. É se agarrar às pequenas coisas, é sentir como se soubesse todas as respostas, mas sofrer com a mudança constante que a vida faz com suas vivências reais. Adolescência, uma grande mudança na vida do ser humano, fase de alteração hormonal, pessoal, corporal, emocional e mental. Aprovação, rebeldia, desafiar os pais por entender que podem ser diferentes, conflitos familiares vividos e outros ainda por viver. Os interesses se estreitam e, muitas vezes, só querem fazer o que estão interessados.


As grandes descobertas em relação ao corpo e à sexualidade tendem a levar essa geração a criar comparações. A crueldade das redes sociais, dos padrões de corpos perfeitos, cabelos lisos, rostos com simetria promovem uma insatisfação corporal tão grande nos jovens, que em inúmeros casos, eles não conseguem ter a sensação de pertencimento, e acabam ficando insatisfeitos com seus corpos e com a vida.


É na adolescência que há o grande peso relacionado ao corpo, pois é neste período que as meninas se transformam em mulheres e os meninos em homens. Um período na vida dos adolescentes em que há grande acúmulo de cálcio nos ossos e, hormônios que não circulavam no organismo, começam a ser produzidos, e os corpos se transformam. Uma fase em que a transformação deveria ser vista como normal, e é aí que o terrorismo nutricional se coloca em grande evidência.


Na visão sistêmica, um transtorno alimentar, vem de famílias em desordens, onde o adolescente muitas vezes está no lugar daqueles pais, ou no lugar de apenas um dos membros e, muitas vezes, tomam as dores ou da mãe ou do pai, assumindo a responsabilidade da vida desses pais. O foco da Terapia Sistêmica está baseado na compreensão dos padrões de comunicação que ocorrem no âmbito familiar, nos locais de trabalho, nos relacionamentos entre casais ou relacionamentos entre pais e filhos.



A forma como se lida com o corpo e com a comida, pode muitas vezes estar conectada com histórias familiares. Por amor, assume-se papéis que não são deles e, acabam repetindo um padrão alimentar que foi passado de geração a geração ou, simplesmente, assumem um sentimento que vem de outro membro da família. Este sentimento pode levar a assumirem um padrão alimentar que não é pessoal. Quando isso acontece, instaurou-se um problema no sistema.


Estudos na área da nutrição detectaram uma intrínseca ligação entre relações familiares, a forma como lidamos com a comida e o nosso corpo. Todos esses elementos, aparentemente independentes, constituem um sistema, ao serem analisados.


Quando a transformação corporal do adolescente não é respeitada, por existir uma ansiedade e pressa para que estejam prontos para a vida, isso poderá trazer prejuízos pelo resto da vida. Um exemplo de prejuízo, que se arrasta pela vida adulta de muitas pessoas, são as dietas restritivas, que podem atrapalhar a reposição de cálcio nos ossos, e impedir o crescimento e desenvolvimento corporal.


O centro da fome e saciedade, ao ser desregulado, gera no corpo uma descompensação hormonal, deposição de gordura corporal, que prejudica o corpo, podendo desencadear transtornos alimentares, e um ganho de peso não esperado para idade.



Sendo assim, ao nos depararmos com um atendimento de um adolescente com Transtornos Alimentares precisamos levantar pontos importantes, diagnosticados em uma minuciosa e atenciosa anamnese, que possa indicar a melhor forma de conduzir o tratamento desse adolescente.

Ao tratarmos o adolescente, devemos observar que:


1) O Processo de recuperação deve ser feito junto aos pais. O atendimento não é ao mesmo tempo, e a família precisa estar inserida no processo e, muitas vezes, também, precisa de ajuda profissional.


2) O atendimento dos pais deve ser separado, isto é, a mãe e o pai devem ser acolhidos separadamente.


3) É necessário investigar se existiu algum trauma envolvendo aquele adolescente com a comida (fome, restrições, intolerâncias, alergias).


4) Não se deve forçar a comer e nem exigir o ganho de peso. As mudanças são feitas à medida que se há confiança no processo.


5) As decisões do que comer devem ser realizadas em conjunto, isto é, entre o profissional e o adolescente, de uma forma gradual, aumentando ou reduzindo a quantidade que se come.


6) É o início do processo da auto responsabilidade. O adolescente precisa compreender que ele será, de agora em diante, o responsável por fazer a sua vida acontecer e respeitar o que recebe dos pais, pois na maioria das vezes, são dependentes de seus pais em vários aspectos.


7) Precisamos entrar no mundo deles. As redes sociais precisam fazer parte dos temas dos atendimentos, e buscarmos, junto com o adolescente, o que eleva e o que é prejudicial à vida. Exemplos que precisam ser deixados e exemplos que precisam ser seguidos.


8) Conversar sobre a importância de se fazer as pazes com os alimentos, sem classificar e excluir os nutrientes que são considerados “maldosos” para o corpo. Exemplo: carboidratos, gorduras. Mostrar como esses alimentos atuam em nosso corpo e a importância deles para o bom funcionamento das nossas células.


9) As dietas precisam ser cada vez mais desmistificadas. E com o avanço do processo, explicar que elas não funcionam, e que são elas que podem, no futuro, gerar sobrepeso, obesidade ou perdas nutricionais, ósseas e corporais irreversíveis.


10) Os adolescentes precisam saber que praticar a presença ao se alimentar é fundamental, evitando distrações com redes sociais, WhatsApp, séries, televisão e outros.


11) E por fim o fortalecimento da autoestima, o reconhecimento da autoimagem e reconstrução do eu é fundamental na recuperação dos Transtornos Alimentares do Adolescente. Ele precisa encontrar qual é o lugar dele, e o papel que ele exerce família, sem estar no meio de nenhuma relação, e muito menos assumir um lugar que não é dele.


Com todos esses fatores e causas envolvidos, o adolescente, sem entender muito bem o processo, quer ser atendido em seus sofrimentos, medos, alegrias, desconfortos, seus vazios existenciais e cabe a nós, profissionais, ajudá-lo a encontrar o seu lugar na vida e em sua família. Um passo fundamental para que ele consiga ficar em paz com seu corpo, e assim, construir uma boa relação com a comida.


Referência Bibliográfica:


​Alvarenga M, Antonaccio C, Figueiredo M, Timerman F. Nutrição Comportamental 1ª edição. São Paulo; Manole; 2015.


Cordás TA, Castilho S. Imagem corporal nos transtornos alimentares – instrumento de avaliação: “Body Shape Questionnaire”. Psiquiatria Biológica. 1994;2(1):17-21.


Hellinger B. Ordens da Ajuda. 1ª edição. Patos de Minas; Atman; 2005.


Hellinger B. O essencial é Simples. 3ª edição. São Paulo; Cultrix; 2014.


Koerner K. Aplicando a Terapia Comportamental Dialética. 1ª edição. Sinopsys, 2020.


Lintariami S. Nutrição Sistêmica. 1ª edição. Belo Horizonte; 2020


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